Crédito estudantil ajuda a reduzir procura de emprego por jovens

A aparente contradição do mercado de trabalho brasileiro, que mantém taxas de desemprego em recorde de baixas (em janeiro ficou em 4,8% para as seis maiores regiões metropolitanas do país), apesar do crescimento econômico fraco, pode estar relacionada a políticas de financiamento educacional. Para o Itaú Unibanco, além do envelhecimento da população brasileira, o avanço do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), voltado para estudantes no ensino superior, pode ter contribuído para a saída dos jovens no mercado de trabalho.

Segundo estudo do banco, a parcela dos brasileiros em idade ativa que estão trabalhando ou em busca de vagas caiu de 57,8% no fim de 2012 para 56,8% em janeiro deste ano. Entre os jovens de 18 a 24 anos, a queda foi 3,1 pontos percentuais, chegando a 67,1%. E o banco atribui parte desse movimento à maior oferta de crédito estudantil, que oferece aos jovens a alternativa de estudo num momento de economia fraca e menos oportunidades de emprego.

Desde 2010, houve mudanças nas regras de contratação e redução dos juros do Fies. A taxa de juros de financiamento caiu de 9% para 3,4% ao ano, os prazos de carência foram ampliados e o estudante passou a poder pedir o financiamento bancário a qualquer momento. Houve um salto de 50 mil contratações em 2009 para 576 mil este ano.

Renda e envelhecimento também influenciam
O economista Luka Barbosa, do Itaú Unibanco, acredita que isso pode ter pesado mais para retirar os jovens do mercado de trabalho do que o ganho de renda dos brasileiros. Quando há aumento dos rendimentos dos chefes de família, diminuiu a necessidade de outras pessoas na casa buscarem emprego.

— O mercado de trabalho está mais fraco, as empresas estão contratando menos e existe a potencialização de um efeito (do Fies) — afirma Barbosa.

A jovem Kamille Oliveira, de 21 anos, trabalhava na loja de roupas da mãe, no Largo do Machado, Zona Sul da cidade, até meados do ano passado, quando foi aprovada para o curso de Medicina em uma faculdade particular. Com a mensalidade beirando os R$ 4.700, recorreu ao Fies e hoje apenas estuda:

— Eu trabalhei com a minha mãe durante o curso pré-vestibular, mas agora estou me dedicando exclusivamente ao estudo. E sem o Fies eu não conseguiria realizar meu sonho de ser médica.

Embora veja um papel da ampliação do Fies sobre a saída dos jovens mais escolarizados do mercado de trabalho, o economista Naércio Menezes Filho, do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, cita o futuro dos jovens menos qualificados como a fonte de maior apreensão.

Entre 2005 e 2012, a parcela dos jovens de 15 a 24 anos com até quatro anos de estudo no mercado de trabalho caiu 13 pontos percentuais, de 64% para 51%, o maior recuo entre todas as faixas.

Para os jovens com até nove anos de estudo, o índice caiu de 56% para 48%. Em paralelo, houve o aumento de jovens na situação “nem, nem” (que não trabalham, nem estudam). Em 2012, dos jovens fora do mercado com até o curso fundamental, 30% não estudavam.

Para Menezes Filho, a explicação mais plausível é a de que o ganho maior de renda dos pais tem levado os filhos a deixar o mercado de trabalho. Em muitos casos, para não se qualificar:

— Não é o Fies que está explicando isso. O jovem não vê necessidade de trabalhar. A hora que a renda dos pais passar a declinar, esses jovens podem entrar no crime.

O economista José Marcio Camargo, da Opus, vai na mesma linha e afirma que há ainda outras causas para a saída dos jovens.

— Um aluno que precisa de financiamento subsidiado dificilmente vai ter uma renda familiar alta para parar de estudar. As causas podem ser os programas de transferência de renda e o aumento da renda das famílias — afirma.

Já Sonia Rocha, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), vê um efeito mais concentrado da transição demográfica e do aumento da renda familiar na saída dos jovens do mercado de trabalho.

 Fonte: O Globo