Manuel Castells Oliván, sociólogo espanhol, professor que domina os aspectos relacionais da internet, consegue reunir em suas plateias nunca menos de mil pessoas. Em encontro realizado em Porto Alegre, foi aplaudido de pé ao finalizar a sua conferência sobre o tema “Ocupação dos espaços públicos como parte fundamental das redes de indignação e esperança que nascem na internet”.
As manifestações populares que vêm ocorrendo no Brasil desde junho de 2013 têm muitas similaridades com as que surgiram ao redor do mundo. Sobre esse aspecto, Castells observou que, apesar dos contextos distintos, esses movimentos têm mais semelhanças do que diferenças. Para ele, há um padrão em todas essas ações, orientado para a ocupação dos espaços públicos, como é o caso da materialização da revolta com interação constante entre o físico e a internet.
Provocador por princípio, desfruta de imensa aceitação quando fala e escreve sobre o mundo virtual. Hispânico da gema, gosta de afrontar e desafiar públicos. Entre acadêmicos e estudantes, recebe simpatia graças à sua trajetória dedicada à educação. No Brasil, foi entrevistado por diversas revistas de circulação nacional. No programa Roda Viva, ao analisar o sistema de ensino na era das redes, destacou a preocupação que deve existir quanto à obsolescência da educação.
Em recente vídeo-documentário-depoimento exibido pelo YouTube, Castells enuncia um ponto pacífico: as escolas, em todos os níveis, incluindo as universidades, têm uma função percebida: a aprendizagem de habilidades. Porém, têm outra intrínseca, não visível, que é a transmissão dos valores dominantes e das formas de poder — que não têm nada a ver com a pedagogia, mas sim com as normas e processos de se conviver em sociedade.
Ele é firme ao dizer que as escolas hoje são obsoletas porque insistem numa pedagogia baseada na transmissão da informação, mas que inexiste tal necessidade, pois toda a informação está na internet. Castells enfatiza que as escolas precisam ser capazes de dar poder intelectual e critérios próprios aos alunos, mas que, antes de tudo, precisam transmitir critérios de buscas e combinações das informações, mediante projetos intelectuais pessoais e profissionais de cada aluno.
Castells é taxativo ao afirmar que todo o sistema educacional hoje é retrógrado, pois não dá poder ao aluno, tornando-o objeto submisso, sujeito a aprender só o que o professor transmite. A observação cai como um petardo, pois hoje os alunos competem com os professores, não porque leem mais, mas porque passam mais tempo na internet e dominam as tecnologias e as redes sociais. Todo mundo tem acesso à informação, que não é escassa nem restrita como no passado; por isso, a função do professor muda completamente.
Muitas escolas e professores proíbem o uso do computador, do tablet e do smartphone durante a aula, justificando serem distração, quando, na verdade, há a preocupação do desafio constante: a comparação do que o professor está falando com as informações obtidas na internet, que podem facilmente ser confirmadas, confrontadas ou apresentarem nova versão. O educador, nesse cenário, precisa habilitar-se para ajudar o aluno a refletir, o que é muito mais difícil do que simplesmente passar o mesmo conteúdo todo semestre. É nessa transformação que muitas escolas estão interessadas.
Se o bullying é cada vez mais presente e devastador nas redes, se o plágio é cada vez mais presente nos trabalhos escolares, se os alunos estão cada vez mais viciados em jogos eletrônicos, se o multitasking é cada vez mais frequente, a escola não pode ficar indiferente a essa realidade.
Se, por um lado, o estudante tem mais fluência digital, por outro, ainda não sabe conectar informações e compra gato por lebre. É nesse contexto que novos procedimentos didáticos devem privilegiar a construção coletiva de conhecimentos mediada pela tecnologia, tendo o professor como partícipe proativo e agente intermediador do processo.
Segundo Castells, a mudança significa romper com as relações de poder da escola e instaurar um espaço colaborativo e não hierárquico para o qual, infelizmente, na maioria esmagadora dos casos, no Brasil, a capacitação de professores ainda é um sério problema a superar.
GABRIEL MARIO RODRIGUES
Presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior e secretário-executivo do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular
Fonte: Correio Braziliense / DF